Amizade é insistência e constância
Quero chorar o seu choro, quero sorrir seu sorriso, valeu por você existir, amigo
Nesta edição do Cronofobia:
A amizade (nem mesmo a força do tempo irá destruir)
Dark Matter
Novo do Molchat Doma
Vá lá dar ibope pro meu texto!!!!
Tempo de leitura: ±11 minutos
Essa edição ficou grandinha, então se quiser lê-la num layout melhor, clique no primeiro título, lá em cima :)
Amizade é insistência e constância
A fórmula da amizade é simples e tem apenas 3 passos. Vamos lá:
É necessário (pelo menos) duas pessoas;
Deve-se que dividir (pelo menos) um interesse em comum;
Deve-se haver constância na relação.
(Acima, vídeo ilustrativo do meu amigo Giovanni Bello me carregando nas costas depois de eu ter torcido meu pé durante minha viagem com ele à Florianópolis)
Duas pessoas
Para começar, uma amizade precisa de (no mínimo) duas pessoas.
Não, uma chatbot IA não é seu amigo. Essas pessoas precisam ser de carne e osso, ter o coração batendo e os olhos abertos — gente dormindo não vale.
Claro que podemos extrapolar e falar que existem amizades entre três, quatro, cinco pessoas. Mas sabemos que aquela “amiga do seu namorado” é amiga do seu namorado até que se prove o contrário. Se não houver uma ligação direta entre você e ela, adivinha com quem ela vai continuar a relação depois do vindouro término?
Interesse em comum
Vale refletir sobre como toda relação é uma troca — e a gente sempre tá fazendo essas transações, mesmo inconscientemente. Se você gosta de passar tempo com alguém, é porque essa pessoa tem algo para te oferecer; seja uma risada, um carinho, ou um combão de uísque e energético. Nenhuma relação — sejamos honestos — é livre de toma-lá-dá-cá. Vamos levar como fonte o axioma matemático que define a experiência humana: “não existe almoço grátis”.
Duas pessoas que não se interessam umas pelas outras nunca vão formar uma amizade.
Imagine o porteiro do seu prédio. Mesmo sem saber o nome dele, há uma relação envolvida — você dá bom dia ao porteiro (espero que dê 😡) e ele te devolve o cumprimento. Para que esse “conhecido” se torne um amigo, há a necessidade de que algo em comum surja, que a transação deixe de ser apenas casual e profissional e se torne afetiva. Talvez vocês dois sejam viciados em One Piece, talvez ele tenha visto todos os Velozes e Furiosos quatro vezes, talvez ele leia Joyce no horário de almoço. Você não sabe até perguntar.
Por isso que eu repito para todas as pessoas que considero amigas: urge a necessidade da verbalização dos nossos interesses.
Por mais que a gente crie interesses romanticos primariamente pelo visual, qualquer relação que quisermos construir além do booty call vai ser montada pelo que temos em comum. O maior cautionary tale de como a gente deve conversar mais com quem a gente encontra é o famoso Pillow Talking, do Lil Dicky (vale ler a letra enquanto vê o clipe — é enorme, mas traz pelo menos uma reflexãozinha).
É claro que você não vai saber os interesses do porteiro se você não perguntá-lo o que ele curte fazer no tempo livre. Temos inúmeras ferramentas para facilitar isso, como as redes sociais, mas precisamos lembrar que a vida das pessoas não é o Instagram, mas que ele é uma janela para o que a pessoa quer mostrar.
Portanto, coloque seus gostos no mundo. Diga pras pessoas que você curte fazer tricô e crochê. Que gosta de Cronenberg. Que é cuckold e também gosta de CBT. Foi desse jeito que eu comecei a organizar surubas: dizendo pras pessoas que tinha interesse em festas de gente pelada.
Se você ver alguém na rua com uma camiseta de uma banda que você gosta, dê um oi para ela — ou, pelo menos, mande um “bandona hein” enquanto passa. Só evite fazê-lo se a camiseta for do Nirvana, Ramones, ou (sim, é a nova) Daft Punk — na maioria das vezes a galera nem sabe o que tá vestindo.
Uma andorinha só não faz verão
Essa edição foi influenciada pela série Parks & Recreation. Terminei de assistir tudo esses dias há uns meses1 e saí boquiaberto — tendo a pachorra de dizer que, em alguns pontos, ela é melhor que The Office2. Uma breve ficha:
Parks & Recreation é uma série de sátira e comédia com 7 temporadas, criada por Greg Daniels (The Office, Upload) e Michael Schur (Brooklyn Nine-Nine, The Good Place, além de ser o Mose Schrute em The Office). A série acompanha Leslie Knope (Amy Poehler), uma servidora pública que trabalha no departamento de Parques e Recreação de uma cidadezinha norteamericana, e mostra sua relação com sua profissão e seus colegas de trabalho.
Fiquei pensando uma cota em como Leslie Knope (uma pessoa teoricamente insuportável) conseguiu manter uma relação tão próxima aos outros (tão insuportáveis quanto, em outras medidas) personagens. Como ela conquistou pessoas tão distintas como Ron Swanson e Tom Haverford.
Tirando o fato da série ser ficção e tudo acontecer porque os roteiristas quiseram, e extrapolando ela para a vida real, posso afirmar que a palavra chave é essa: constância.
O segredo de Leslie Knope é que ela seguiu à risca nossos três passos:
Criou relações individuais com cada um dos coadjuvantes;
Verbalizou (e muito) seus gostos pessoais;
Encheu a porra do saco das pessoas por sete temporadas.
O escritório de Leslie Knope tem fotos e livros — e tudo tem a ver com seus interesses principais. Todo mundo sabe que ela tem uma fascinação especial por mulheres em cargos públicos, e que ela ama de paixão Lil Sebastian (e quem não ama está errado 🤏🐴). Ela nunca deixou isso escapar e sempre verbalizou com bastante ênfase cada uma das coisas que ela gosta.
Ela não é a única a fazer isso: Ron Swanson publicisou tanto suas filosofias e pensamentos políticos que o ator Nick Offerman precisou fazer uma música para que as pessoas entendessem que aquilo era um personagem.
Mas é uma produção de ficção!
Eu sei que Parks & Rec é uma série de TV e que essas características — o amor de Andy por música, o ódio de April por tudo, a obsessão em sar saudável de Chris — são jogadas em nossa cara a todo o momento de propósito, exatamente para a gente criar distinção entre as pessoas.
É fácil entender quem é quem numa série pois não estamos no mundo real, em que um grupo qualquer de pessoas tem grande probabilidade de ser esse aqui:
Os escritores criam personagens que cabem em um espaço emocional limitado. Se houvessem dois ou três Chris, talvez eu escolhesse um deles para me identificar. Se houvesse mais que um Tom eu nem teria continuado a ver a série.
Por isso que verbalizar nossos interesses e afinidades nos separa do resto da galera — e mesmo se para o grupo de heterotops acima você se parecer “mais um cara de cabelo colorido em um mar de emogóticos”, no meio dos emogóticos eles vão saber que você é, na verdade, um cholo-goth — e não corporate-goth ou trad-goth.
(Em tempo: escutem Cholo Goth).
I DIGRESS. Voltando:
Constância (ou, porque não, insistência?)
Um disclaimer: to aqui falando de criar relações de amizade e afeto. Não to falando de sexo. E, em qualquer dos dois casos, se você percebeu que a pessoa não quer dividir qualquer informação com você, largue a porra do osso. Quando eu falo “insistência”, eu to falando de continuar mostrando pras pessoas que você tem real interesse nelas após uma primeira abertura. Se essa primeira abertura nunca aconteceu, saia de mansinho e não encha o saco.
O que Leslie Knope fazia com maestria é mostrar interesse legítimo nas pessoas ao seu redor. Ela lembrava do que elas verbalizavam, e agia com essas características em mente — e vice versa, afinal, não é apenas uma vez que vemos as pessoas ganhando Leslie com um prato de waffles.
A diferença entre saber e agir é exatamente a ação. Não adianta nada saber que as pessoas que você tem interesse em se aproximar gostam de certas coisas se você não se colocar out there. Então você tem um colega de trabalho que gosta de Senhor dos Anéis? Já pensou em convidá-lo para comer um lanche naquela hamburgueria com temática Hobbit? Você gosta de puxar ferro e aquela colega do trampo também? Já pensou em marcar 🤢 uma academiazinha 🤢 antes do expediente?
O segredo da amizade é a constância dessas interações — ou seja, é necessário que o interesse seja recíproco. Não adianta nada só o colega gostar de Senhor dos Anéis e você não, ou então a relação de vocês será construída por visitas à hamburgueria que você nem gosta tanto assim.
Mas e se eu não encontrar nenhuma afinidade com a pessoa, mesmo depois de perguntar?
Bem, do mesmo jeito que há términos que na verdade são livramentos, há não-começos que também são. You dodged a bullet, provavelmente.
E seu ponto???
O que queria com esse artigo era descrever isso que venho pensando há meses (anos?) e que Parks & Rec me fez relembrar: não adianta nada você querer conhecer gente nova se não se colocar à disposição das pessoas. E olha que quem tá escrevendo isso é uma pessoa descrita como indisponível por uma boa galera — eu sei que a culpa é minha em muita relação que não se desenvolveu, afinal, não tenho tempo, estou longe, e sou péssimo nas relações digitais.
O importante é saber que esse passo é importante e que só assim que você vai conseguir sair desses marasmo do adulto que só tem os mesmos amigos de quando tinha 12 anos — e vai, enfim, ampliar seus horizontes.
Se você souber que não se pode fazer novos amigos sozinho, que é necessário um interesse legítimo, e que ações ativas em volta desses interesses são essenciais, você já tem o bastante para sair por esse mundão tentando novas relações.
Where’s the catch?
Há um quarto ponto oculto: honestidade.
Se alguém se aproximar de você querendo criar uma relação e você não estiver muito interessado, seja uma pessoa honesta. Sei que muita gente quer ser suave e só manda o “vamo marcá” sem nunca marcar nada, mas as vezes um fora explícito é necessário: “poxa, obrigado pelo convite, mas não to com muito tempo para sair com novas pessoas.”
Eu vivo bastante no “faça aos outros o que gostaria que fizessem a você” e to cada vez mais tentando praticar essa filosofia com frequência. Portanto, se alguém quer se aproximar de mim e eu não to a fim — por qualquer motivo — eu tento ser sincero e claro (fazendo o meu melhor para não soar grosseiro).
Mostrar o interesse pelas pessoas me faz parecer emocionado demais — e foda-se, prefiro ser assim do que ser descolado por fora e desesperado por dentro.
Conclusão
Quem sabe, prestando atenção nessas características, a gente não consiga crescer adultos mais saudáveis e rodeados de pessoas diferentes, ainda mais sabendo que cada vez mais nosso costume é de nos fechar em bolhas cada vez mais restritas (eu sou culpado nisso).
É bom ter ao meu redor pessoas com as quais eu nem tinha tanta afinidade no início, mas que, com o tempo e a convivência, se tornaram amigos de confiança, cujos abraços são sempre bem-vindos. É com eles que canto essa a plenos pulmões:
Rapidinhas
Dark Matter
Há uma cota eu li o livro Dark Matter, de Blake Couch, e dei 3 estrelas no Goodreads (deveria ter sido 2,5, mas lá não tem como fazer isso). Não achei grandes coisas.
A ideia é boa — pega toda a coisa do gato de Schrödinger e extrapola legal — mas a execução no livro não foi das melhores. Porém, a designer
disse uma coisa interessante na resenha dela no Goodreads:[…] é uma escrita absurdamente visual, de frases crus e brutas jogadas na solidão dos parágrafos. […] É claro que esse é um texto que vem de um roteirista e é absurdo como tudo nesse livro grita ALGUÉM-TEM-QUE-FAZER-UMA-ADAPTAÇÃO-PRO-CINEMA, mas ao mesmo tempo tem imagens tão absurdas que me pergunto quem seria capaz de dar luz à essas ideias sem comprometê-las.
Porra mermão, fizeram uma série. E olha, na moral, é boa DE-MA-IS. O roteiro é do próprio autor, e definitivamente essa é a melhor mídia pra história que o cara tinha pra contar.
A série segue o livro por boa parte, depois vai pra um caminho de explodir cabeças, e fica cada vez melhor conforme as cenas vão passando — até culminar em 3 episódios finais de ficar sentado na pontinha do sofá.
Vale demais ver pela história, pela adaptação, pela atuação de Joel Edgerton, Jennifer Connely e da brasileira Alice Braga. Porém, principalmente, vale ver pois é um dos raros casos de quando a adaptação audiovisual é (bemmmm) melhor que o livro.
Белая Полоса / Belaya Polosa
O disco novo dos Bielorussos do Molchat Doma é bem legal. Como disse uma amiga sobre a primeira música:
essa eu queria dançar no subterrâneo do madame com pelo menos 3 caipirinhas de sakê no corpo (específico, eu sei)
Julgamentos a parte sobre caipirinha de sakê (eu adoro, mas apenas no sigilo), o disco tá crocante. Bom pra quem gosta de sintetizadores e gotiqueira em geral. Senti bastante um retrogosto de Depeche Mode, não sei se to maluco. Escute lá e comente aqui o que você achou.
Vá lá dar ibope pro meu texto!!!
No meu trampo novo uma das minhas funções é criar conteúdo. E eu criei. Só que, pro negócio gerar tração, eu preciso de gente que vá lá e dê o like, o share, o retuíte, o re-bluesky-te, o re-linkedin-te, enfim.
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Essa edição ficou uma cota como rascunho.
Podemos discutir sobre isso em outra edição, deixe sua opinião nos comentários.
Amei o que você escreveu sobre amizade. E sobre tentar ser honesto com as pessoas (eu venho tentando fazer isso, mas às vezes a gente acaba magoando as pessoas só falando a verdade. É triste).
Sempre bom te ler ❤️
Eu discordo fortemente do "Não existe almoço grátis", acho que isso é um exagero da ideia de troca como se nada pudesse ser dado apenas pela vontade de dividir.
Dito isso, concordo que amizades precisam de esforço mútuo ou se tornam relações de puro interesse.
Mas é engraçado como "interesses mútuos" podem ser até mesmo um trauma compartilhado.